Pesquisar
Close this search box.

Não é mimimi: as marcas do racismo estrutural

  1. Home
  2. /
  3. Notícias Antigas
  4. /
  5. Não é mimimi: as...
    Na última sexta-feira (20) comemoramos o Dia da Consciência Negra em homenagem a Zumbi dos Palmares. A data não pode ser esquecida ou silenciada, pois, mesmo com muitos avanços, ainda em 2020 o racismo se manifesta de muitas formas e de modos diferentes em vários lugares do Brasil e do Mundo. 

    Racismo é a denominação da discriminação e do preconceito (direta ou indiretamente) contra indivíduos ou grupos por causa de sua etnia ou cor. É importante ressaltar que o preconceito é uma forma de conceito ou juízo formulado sem qualquer conhecimento prévio do assunto tratado, enquanto a discriminação é o ato de separar, excluir ou diferenciar pessoas ou objetos. 

    Racismos 
    De maneira menos direta, o racismo institucional é a manifestação de preconceito por parte de instituições públicas ou privadas, do Estado e das leis que, de forma indireta, promovem a exclusão ou o preconceito racial. De forma ainda mais branda e por muito tempo imperceptível, essa forma de racismo tende a ser ainda mais perigosa por ser de difícil percepção. Trata-se de um conjunto de práticas, hábitos, situações e falas embutido em nossos costumes e que promove, direta ou indiretamente, a segregação ou o preconceito racial. 

    Exemplos 
    No dia 25 de maio, o afro-americano George Floyd foi morto durante uma abordagem da polícia em Mineápolis. Floyd passou mais de sete minutos rendido de bruços pelo policial, que manteve o joelho em seu pescoço até matá-lo por sufocamento. A divulgação em plataformas de redes sociais e transmissão pelos meios de comunicação de todo o mundo desencadearam uma série de manifestações e protestos nas principais capitais mundiais.

    A questão do racismo não é só dos norte-americanos e é uma situação que diz respeito também à realidade brasileira. No Brasil, existe um racismo estrutural que vem desde “libertação” dos escravos pela Princesa Isabel em 13 de maio de 1888.

   Um caso mais recente registrado em outubro ocorreu com um entregador. Elson Oliveira, de 39 anos, foi vítima de racismo ao tentar entregar um pedido em um condomínio de luxo de Goiânia. O profissional foi levar o pedido, mas o endereço estava incompleto no cadastro. A gerente da hamburgueria, Ana Carolina Gomes, enviou uma mensagem pelo aplicativo pedindo o número da quadra e do lote e solicitando a entrada do funcionário.

    A cliente, então, digitou: “Esse preto não vai entrar no meu condomínio. Mandar outro motoboy que seja branco. Eu não vou permitir esse macaco”. Diante das respostas, a gerente cancelou o pedido, dizendo que não aceitaria o ato de racismo. O aplicativo Ifood informou que já identificou e baniu a usuária suspeita de enviar as mensagens e que entrou em contato com a empresa para prestar apoio psicológico ao entregador.

    Perto de nós
    A professora Adriana Marcuz (47) é de Rolândia e contou que já foi vítima de racismo durante a sua vida. Ela lembra de uma situação que ocorreu com ela tinha seis anos de idade e sua irmã tinha quatro anos. “Lembro que eu e minha irmã passávamos em frente de uma casa onde moravam meninas brancas e loiras. Toda vez que a gente passava por lá voltando da creche elas nos xingavam de ‘negrinhas do saravá’. Aquilo me marcou muito e eu chegava em casa chorando. Eu dizia para a minha mãe que não queria passar por aquilo e que não queria mais passar em frente daquela casa”, lembrou Adriana.

    Na época, a mãe de Adriana explicou para as filhas que situações como aquela iriam ocorrer por várias outras vezes na vida de ambas, e que elas teriam que continuar passando por aquele caminho e precisariam ser fortes para enfrentar a situação.

    A professora ainda contou que aos sete anos de idade ela já começou a entender o que era ser negro na sociedade, especificamente dentro de Rolândia. “Era uma discriminação muito grande até mesmo de amigos. Na minha sala no Souza Naves era praticamente a única negra e, para que eu não fosse tão discriminada, minha mãe gastou todo o salário para comprar uma roupa de marca para mim ir todos os dias para o colégio”, relembrou. 

    Sobre o Dia da Consciência Negra, Adriana afirma que é algo muito importante, mas que tem de ser trabalhado todos os dias. “Essa consciência precisa ser de rotina, ela precisa fazer parte da vida do ser humano todos os dias e não somente no dia 20 de novembro”, ressaltou.

    O ex-vereador Maico Francisco Pereira, o Maico Dida (35), também relatou que já passou por alguns momentos em que foi vítima de racismo. “Teve alguns momentos que vivenciei na escola em que os colegas sempre me chamavam “negrinho” ou “negão” e que a gente leva para a vida toda”, relembrou. Ele afirma que dizer que foi vítima de racismo não é um ato de vitimização, é apenas uma exposição do que as pessoas negras sofrem durante toda a vida, e que para muitas pessoas ainda é algo normal.  “Até quando eu me tornei vereador eu ouvia algumas coisas com tom racista e que não vou esquecer e que isso mostra uma grande divisão”, contou.

    Maico afirmou que teve noção da existência do racismo estrutural existente na sociedade aos 13 anos durante um evento do Dia da Consciência Negra que ocorria no Villanueva, colégio em que ele estudava na época. “Eu participei de um desfile e fiquei em 2ºlugar. Mas lembro de ter escutado na ocasião alguns comentários do tipo: para quer fazer um desfile com negros?”, relembrou.

    Maico afirma que trabalha muito a questão da autoestima com a filha que ainda é uma criança e tem sete anos, mas que ele tem certeza que em algum momento da vida vai ser vítima de algum comentário ou situação racista. 
“Sempre digo para ela o quanto ela é linda e que o cabelo dela é perfeito. Como ainda vemos tantos casos nos dias de hoje eu tento passar para ela todas estas questões mesmo que ela ainda seja só uma criança”, assegurou Maico Dida, já preocupado.

    Sem feriado
    Em novembro de 2014, a Câmara de Vereadores de Rolândia revogou a lei municipal 3.393/2010, que criou o feriado do dia da Consciência Negra na cidade. A decisão acatou a suspensão determinada em liminar na Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) movida pela Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep). 
Sem um conselho de Igualdade Racial, quase não houve nenhuma manifestação com a revogação da lei e do feriado.

    Sem Conselho de Igualdade Racial 
    Em 2016, Rolândia realizou uma Pré-Conferência de Promoção da Igualdade Racial no Centro Cultural Nanuk com o intuito de se criar o Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial. Maico Dida foi o vereador que fomentou essa discussão e chegou a fazer uma lei que criava o Conselho antes de terminar seu mandato. Infelizmente, não foi dado continuidade no processo e está tudo parado.


    Prêmio Zumbi
    Em novembro de 2018, a professora Jandira Amélia da Silva Rodrigues, com 75 anos à época, tornou-se foi a primeira pessoa em Rolândia a receber o prêmio Zumbi dos Palmares, que homenageia destaques na defesa dos direitos humanos, no combate à discriminação e ao preconceito racial. Jandira foi a primeira professora negra de Rolândia e foi indicada para o prêmio vereador João Ardigo. Instituído em 2004, o prêmio nunca havia sido dado a nenhuma pessoa ou instituição até que o Jornal de Rolândia “incitou” a Câmara a homenagear alguém.


Compartilhe:

Facebook
Twitter
WhatsApp
Email

VEJA TAMBÉM: