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Grupos Étnicos

Memórias do Padre Zé

Dom Geraldo Fernandes aceitando o garoto José Agius no caminho sacerdotal com o rito da ‘tonsura’ (1962)

Eu sei o que significa se sentir estranho em terra estrangeira. Não só porque eu mesmo vim para o Brasil de outro país, mas também porque minha família tem sido família de emigrantes. Meus tios, irmãos de minha mãe tinham emigrado para a Austrália nos anos 1930. Meu pai, minha tia, irmã dele e meus irmãos os seguiram pelo início dos anos 1950. Eu também devia ter seguido, mas preferi ser missionário no Brasil em 1961. A emigração dos malteses para a Austrália começou, de fato nos inícios de 1900, mas chegou ao seu ápice entre 1949 e 1961. O ponto mais alto da emigração foi no ano 1954-55, quando em torno de 10.000 malteses foram procurar uma vida nova na Austrália. Assim como fizeram, no mesmo período, muitos italianos, ingleses e irlandeses e outros povos europeus. Depois da Segunda Guerra Mundial (1039 – 1945), a Europa experimentou muitas privações e seus povos procuraram futuro melhor bem longe da terra natal. Quanto sofrimento a emigração trouxe às nossas famílias! Os emigrantes romperam com suas tradições, suas culturas e, até mesmo, seu modo de viver a Fé, morando num país estrangeiro e com gente diferente. Quantos filhos se separaram dos pais e nunca mais se encontraram! E quantos outros quiseram voltar para trás, mas foram impedidos pela situação ou por falta de dinheiro! E quantos morreram ansiando pela terra natal!

Neste contexto histórico, eu devia ter ido com minha família à Austrália, mas eu não queria ser emigrante; queria ser missionário no Brasil. Mas, eu não sabia que o Brasil era também um país de imigrantes europeus. Por isso, eu me “senti em casa” quando fui enviado para exercer meu ministério sacerdotal em Rolândia: encontrei aqui alemães, suíços, austríacos, italianos, portugueses, espanhóis, libaneses e japoneses, ainda da primeira geração. Minha missão que não foi exercida na Austrália, foi exercida num ambiente parecido no Brasil. Me identifiquei com os imigrantes de Rolândia porque me senti um deles:

1) COLÔNIA ALEMÃ: incluindo suíços e austríacos era bem organizada. O Clube Concórdia era a sede da cultura e das tradições da Alemanha. Atrás do Clube Concórdia existe até hoje a Igreja Evangélica Luterana, que oferecia serviços religiosos aos alemães luteranos. Do lado católico, a Capelania Alemã, aos cuidados dos Padres Palotinos de Londrina, cuidava dos serviços religiosos dos alemães católicos, primeiro na Igreja Matriz, depois na Igreja São Paulo e, mais tarde, na Capela do Centro de Pastoral. Sempre houve convivência fraterna entre luteranos e católicos. Vendo a necessidade dos alemães católicos de terem um local apropriado para suas reuniões, o diretor nacional das Capelanias Alemãs no Brasil, Monsenhor Otto Amman conseguiu da Adveniat, entidade filantrópica dos Conferência dos Bispos da Alemanha, uma verba substancial para construir uma linda Capela e Biblioteca “Frei Walter Kempf” junto com o Centro de Pastoral “João de Deus”. Há também o Consulado Honorário da Alemanha, que cuida dos interesses dos alemães de todo Norte do Paraná. Havia também uma escola para os filhos dos alemães na Fazenda Janêta, estrada de São Rafael, chamada “Kinzelschule”, que foi sucedida pela “Escola Roland” na cidade. Também funcionava pelas fazendas dos alemães o “Comitê Pro Arte” que realizava atividades artísticas entre seus associados, sob a coordenação da Sra. Hildegard Kempf, então secretária do Consulado. Funcionava também uma classe de catequese para filhos de alemães católicos por conta da Dona Mathilde Kempf da Fazenda Palatina. Havia também um belíssimo Museu de Arte antiga na Fazenda Belmonte de propriedade do Dr. Ricardo Loeb Caldenhof e sua esposa Hanna.

2) COLÔNIA JAPONESA: também estava muito bem organizada. Atividades de tradição folclórica japonesas eram realizadas no Clube Japonês –A.C.E.R.- que fica atrás do Banco do Brasil. Existiam Também algumas escolinhas de língua japonesa para as crianças. Para jovens nisseis católicos, eu tinha formado o “Círculo Estrela de Manhã” coordenado por Thuneo Higa e Mário Utiyama, seguindo a orientação da Pastoral Nipo-Brasileira. Eventos religiosos tradicionais aconteciam no pátio do Templo Budista, a rua Paranaguá, onde, até hoje, uma monja presta grande serviço humanitário e espiritual aos japoneses budistas e seus descendentes. Maia tarde, foi adquirida pela Colónia uma grande érea, ao lado do Cemitério Municipal, onde ajeitaram o “Campo do Nissei”. Não posso deixar de mencionar também o vasto terreno na estrada de Bandeirantes, onde se localiza o “Museu da Imigração Japonesa” e onde, a partir de 1978, a Colónia Japonesa vem sediando a “IMIN”, evento que comemora a chegada dos primeiros imigrantes japoneses no Brasil em 1908.

3) COLÔNIA ITALIANA: eram muito poucos os italianos naturais da Itália. Na sua grande maioria, eram filhos ou netos de italianos. Contudo, posso afirmar que os italianos foram muito atuantes na Comunidade. Comunicativos e alegres, foram responsáveis por introduzir na região traços culturais que trouxeram consigo da Europa ou das fazendas de café dos Estados de São Paulo e Minas Gerais. Entre esses traços, posso citar o costume de comemorar o final de uma boa safra com grande festa no terreiro de café. Muito religiosos, se reuniam para suas rezas e novenas nas Capelas por eles construídas: São Martinho, Jaborandi, Bartira, Quilómetro 10, Ribeirão Vermelho e Caramurú. O esporte que mais apreciavam era “futebol” e “boca”. Aí pelas tantas, conversando com Dr. Álvaro Pesenti e José Antônio Vanzella, pensávamos em agruparas lideranças para criar uma associação que pudesse manter, em Rolândia, as tradições culturais italianas. Conseguimos agrupar um bom número de “oriundi” e, sob o dinamismo de Álvaro Pesenti nasceu a “Sociedade Cultural Recreativa La Famiglia” com um jantar numas das salas do Centro de Pastoral “João de Deus” no dia 3 de fevereiro de 1989. Esteve presente nesta primeira reunião o Sr. Remo Veronese, Consul Honorário da Itália no Norte do Paraná. Domingo seguinte, foi celebrada missa em língua italiana pelo Monsenhor Vitor Groppelli. Mais tarde, a Sociedade formou com êxito o grupo de danças italianas “Tarantella”, composto por jovens de descendência italiana. Ficaram famosas as festas “Del Vino, del Formaggio e dela Polenta” que promoviam todos os anos. Entre os primeiros integrantes, figuravam, além de Álvaro Pesenti e Nico Vanzella, os seguintes senhores com suas respectivas esposas: Moacir Canônico, José Roberto Beffa, Ailton Liberatti, Claudio Tribulatto, João Carminatto, Orbile Lepre (Bilelo) Antonio Teté, Nelson Armacollo, Bernardo Zanetti, Ênio Campiolo, Braulino Dezan, Otacílio Campiolo, Antonico Lonardoni, Dorival Darini, Ezequiel Campaner, Norival Moré, Geraldo Lonardoni.

4) COLÔNIA PORTUGUESA: mesmo não sendo muito numerosa, os portugueses formavam um grupo muito unido. Alguns eram donos de casa comerciais “Secos e Molhados” bem conhecidas e mais um, o Sr. Manoel Carreira Bernardino, era dono da “Viação Carreira” que fazia a linha de Rolândia para todas as cidades desta região. Muito religiosos, eles lideravam os festejos e as campanhas cujo objetivo era erguer a Igreja Matriz e a Casa das Franciscanas do Colégio Santo Antônio. A devoção para com Nossa Senhora de Fátima foi trazida pelos portugueses. E até conseguiram trazer da cidade do Porto, em Portugal, uma linda imagem de Nossa Senhora para a Igreja Matriz em 1966, cujo altar era devotamente cuidado pelas senhoras portuguesas.

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Monsenhor José Agius Monsenhor

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