Infelizes para sempre

Por Carla Kühlewein

Engana-se quem pensa que todo conto de fadas acaba com “felizes para sempre”. O dinamarquês Hans Christian Andersen escreveu várias histórias com um final bem diferente… “O soldadinho de chumbo” é uma delas. A versão que trago aqui dessa história foi publicada em 1967 em conjunto com outras de Charles Perrault e dos irmãos Grimm. Com uma capa bem atrativa: as personagens principais de cada história se movem conforme o livro se movimenta, a coleção deve ter sido uma grande novidade para a época!


O conto de Andersen começa com um menino que ganha de presente uma caixa com 25 soldadinhos de chumbo, todos iguais, menos um: ele não tem uma perna. Assim que sai da caixa, o soldadinho se depara com um arsenal de brinquedos, inclusive uma bailarina equilibrada na ponta de um dos pés (assim ele achou que ela também tivesse somente uma perna). Daí em diante, inicia-se a saga do pequeno herói: primeiro cai de uma altura de três andares, depois vai parar em um barquinho de papel que desliza por um córrego, passa por um túnel escuro até ser atingido por um redemoinho e cair na água, então é engolido por um peixe enorme que é pescado e chega às mãos de uma cozinheira que resgata o soldadinho e o devolve ao dono (ufa!).


Mas a trajetória do soldadinho não acaba por aí… De volta à companhia de sua amada bailarina, ele é lançado na lareira acesa, em seguida um vento empurra a bailarina para o mesmo destino e assim termina a história: “Na manhã seguinte, quando a empregada veio limpar as cinzas, viu que o chumbo do soldadinho tinha-se derretido e formado um coração. Da bailarina sobraram lantejoulas, que estavam negras como carvão”.


O final de vários contos de fadas escritos por Andersen é assim: infeliz, o que faz dele um escritor peculiar. Além disso é ele quem cria tudo, por isso é considerado o pai das histórias autorias (diferentemente de Perrault e dos irmãos Grimm, que registraram as que já existiam). Não por acaso seu nome dá título ao prêmio mais importante da Literatura Infantil em todo o mundo (conhecido também como “nobel”): o Hans Christian Andersen Award.


No fim das contas, parece que as histórias de Andersen não tiveram um final assim tão infeliz…

Carla Kühlewein é graduada em Letras Vernáculas e Clássicas (UEL), Mestre em Teoria Literária e Literatura Comparada (Unesp) e Doutora em Literatura e Vida Social (Unesp).

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