Protestos desencadeados pela crise no Peru mantiveram centenas de turistas, incluindo duas rolandenses, presas na cidade de Cusco, próximo a Machu Picchu
Duas moradoras de Rolândia passaram por momentos de medo e tensão durante uma viagem turística ao Peru. A professora e escritora Fernanda Polvani Festi e a sua filha Ana Laura saíram de Rolândia no dia 02 de dezembro com destino a Lima. Elas haviam comprado um pacote de viagem de 11 dias no intuito de explorar o máximo possível da riqueza cultural peruana, mas não sabiam que iam presenciar muito mais no país vizinho.
“Assim que chegamos a Lima, o guia nos contou algo sobre uma possível manifestação no centro histórico e o número de policiais nas ruas só confirmava a iminência do fato. No entanto, conseguimos fazer todo nosso roteiro sem problemas e sempre um dia à frente da confusão que estava por vir”, conta Fernanda.
Ao sair de Lima, elas foram para Paracas, local em que visitaram as Ilhas Ballestas com lobos marinhos, pinguins e muitas aves. Depois, seguiram de ônibus até Nazca para sobrevoar as misteriosas linhas que formam inúmeras imagens que só podem ser vistas do céu. “Na sequência, exploramos muitos parques arqueológicos, monumentos e templos sagrados recheados de muita história e beleza na cidade de Arequipa, cercada por três vulcões ativos e deslumbrantes”, lembra Fernanda.
Em Arequipa, receberam a notícia de que o presidente do Peru, Pedro Castilho, havia sido preso depois de tentar dissolver o congresso aplicando um golpe de Estado. “A tensão entre os guias da viagem era nítida, contudo nosso roteiro continuou sendo seguido”, conta. O que elas não sabiam é que a derrubada do ex-presidente iria provocar protestos de rua violentos no Peru, assim como bloqueios de rodovias, de trens, e de aeroportos que prenderam centenas de turistas no país.
Sob um clima de incertezas, seguiram para Puno, onde aprenderam muito com os Uros, povo que vive nas ilhas flutuantes do Lago Titicaca (tigre cinza na língua Quechua) – lago navegável mais alto do mundo (3812 m). E depois disso, no dia 10, chegaram em Cusco para o passeio que motivou toda a viagem: a lendária cidade Inca de Machu Picchu.
“Até então, víamos nos canais locais as notícias de manifestações que ganhavam força e se espalhavam pelos Estados, porém jamais imaginávamos que a situação fosse chegar ao ponto que chegou. No dia 12, após conhecer um dos lugares mais mágicos e incríveis da minha vida, na volta, já à noitinha, fomos informadas de que a cidade estava tomada pelos manifestantes e que todos os passeios seriam cancelados no dia seguinte”, recorda a escritora.
Mesmo com os protestos, na manhã seguinte, alguns grupos conseguiram ir às montanhas. Em Cusco a situação ficava cada vez mais caótica e preocupante. “Grupos organizados forçavam o fechamento das lojas e tomavam os principais locais da cidade. No final do dia, as ruas estavam interditadas, assim como a maior parte das rodovias e todos os aeroportos do país”, pontuou.
Todo a situação ocorreu pelo fato de grande parte dos manifestantes não aceitar a vice-presidente Dina Boluarte como representante e exigir que o presidente detido fosse libertado. Além disso, exigiam que os representantes do congresso fossem todos trocadas e uma nova constituição fosse feita. “Precisamos ficar três dias a mais no Peru, praticamente presas no hotel, saindo apenas para almoçar e jantar e ‘espiar’ de longe”, afirma Fernanda.
Mãe e filha contaram que, no Brasil, amigos e familiares não estavam acreditando na situação, pois os noticiários brasileiros pouco mostraram a respeito. “Enquanto nós víamos ruas interditadas por quilos de lixo queimado, fachadas de loja quebradas, comerciantes desesperados com os saques que ocorreram e policiais tentando conter os mais violentos, o restante do mundo estava assistindo aos jogos da Copa do Mundo”, relata.
Fernanda afirma que quase 800 turistas ficaram presos em Machu Picchu por três dias, pois a ferrovia – único meio de acesso ao local – foi tomada e teve parte de seus trilhos arrancados. A situação só foi se acalmando quando o governo decretou estado de emergência por 30 dias e as forças armadas foram convocadas para conter os protestos, cada vez mais violentos. “Eu e minha filha conseguimos embarcar de volta no final do dia 17 e chegamos em Rolândia no dia 18. Chegamos aliviadas e, apesar do susto, muito gratas pela oportunidade de ter conhecido profundamente o povo peruano e suas raízes culturais que são tão cuidadosamente preservadas e repassadas durante tantos séculos. E, de quebra, ainda pudemos presenciar uma parte da história política do Peru sendo escrita”, afirma a professora.
Fernanda lembra que desde que viu a imagem de Machu Picchu em um livro de história, tinha vontade de um dia conferir tudo pessoalmente, e mesmo com todos os ocorridos, recomenda a viagem para todos que têm o mesmo sonho. “Aproveito para incentivar todos que puderem um dia conhecer outros lugares e seus costumes. Trata-se de algo enriquecedor e que muda nossa visão, principalmente em relação ao valor que devemos dar a nossa história e à preservação das maravilhas naturais de que ainda dispomos”, pontua.
A situação no Peru
Depois de semana passada, as autoridades peruanas iniciaram a semana com a expectativa de que os violentos protestos ocorridos no país, após a destituição do presidente Pedro Castillo, sejam reduzidos nos próximos dias. A sucessora Dina Boluarte anunciou no domingo (18) que fará uma reforma ministerial e prometeu investigar as mortes de manifestantes. A família de Castillo teria obtido asilo no México, segundo Boluarte. Nesta semana, o Congresso antecipou as eleições gerais para abril de 2024 – normalmente seria em 2026.