Ser ou não ser… camaleão?

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Sobrelinhas – por Carla Kühlewein

O reino animal é repleto de figuras exóticas, que mudam o comportamento conforme a ocasião (não, não estou falando dos humanos). Algumas espécies até alteram a forma física, como o camaleão, réptil da família dos lagartos que, quando se sente ameaçado, se camufla, ficando praticamente invisível.


Não é por acaso que Evelyn Heine selecionou esse réptil como personagem de um de seus livros infantis, o ‘Comigo não, camaleão!’. Não é exatamente uma história, mas uma sequência hilária de comparações do comportamento do animal com o de um ser humano:

“Uma hora ele é verde, outra é azul.
Camaleão muda de cor quando dá na telha.
Parece o cabelo de minha tia Eleonora, um dia preto, outro ruivo, outro cheio de mechas loiras”.
Como toda comparação, semelhanças e diferenças entram em evidência. No caso da tia Eleonora, a semelhança está na alteração de cores (de cabelo e de pele) já a diferença, na intenção da mudança. Ao contrário do camaleão, que se camufla pra se proteger, a tia quer é ser muito bem notada.
Até ela ouvir a história do dia em que o camaleão caiu no rio e quase morreu porque ninguém o ajudou, já que estava azul da cor do mar:

“Quase morreu afogado.
Que susto, coitado!
Daí ficou cor de laranja,
Pra chamar muita atenção.
O pato viu e deu uma mão.
E acabou-se a confusão”.

Ela aproveitou a deixa pra mandar uma lição e disse: “a vida é transformação… que nem o camaleão”. Parece mesmo que Eleonora passa por um processo camaleônico às avessas, pois quer se mostrar e não se esconder. E assim segue o livro, filosofando sobre as possíveis comparações entre os seres (vale a pena conferir!).


Ora, há milhares de camaleões espalhados por aí trafegando em uma via de mão dupla: sumir na multidão ou destacar-se em meio a ela (sim, agora estou falando dos humanos). E assim forma-se uma legião de seres paradoxais: buscam fama e, ao mesmo tempo, reivindicam privacidade.


Mas alguns deles (sempre há) não se situam nem lá nem cá, assumem uma postura “acamaleônica”, algo assim no entremeio que lhes permita apenas ser, sem excessos ou privações. Afinal, vida é transformação, sendo ou não, camaleão…

Carla Kühlewein é graduada em Letras Vernáculas e Clássicas (UEL), Mestre em Teoria Literária e Literatura Comparada (Unesp) e Doutora em Literatura e Vida Social (Unesp).

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