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Felicidade Cega

Sobrelinhas – por Carla Kühlewein

“E então eles se casaram, tiveram uma filha linda como um raio de sol e viveram felizes para sempre”. Assim inicia a obra infantil de Ana Maria Machado ‘História meio ao contrário’. Especialista em contrários, a autora recheia esse livro com novidades, daquelas que nos surpreendem a cada página. Afinal, isso de viver feliz pra sempre é meio ultrapassado, não?

A própria Machado adverte: “Viver feliz pra sempre não é fácil não. Pra falar a verdade nem é muito divertido. Fica tudo tão igual a vida inteira que fica até sem graça”. Pensando por esse lado, até que ela tem razão…

Enfim, acontece que a ‘História meio ao contrário’ tem rei, rainha e príncipe como tantas outras. Porém neste livro, um dia o rei decide sair da rotina e ficar na janela do palácio observando o que acontecia… quando entra pelos corredores do castelo aos berros, alegando que alguém havia roubado o sol (afinal de contas, estava escuro lá fora).

O susto levou o rei a pensar que o sol tivesse sido roubado por um ladrão (veja só isso!). Imediatamente perguntou ao conselheiro porque não tinha sido avisado antes sobre o terrível acontecimento. “É que vossa majestade é um homem tão feliz para sempre que ninguém quis incomodá-lo com essas coisas”, respondeu o conselheiro. Segue-se assim uma perseguição ao suposto ladrão, que só poderia acabar em… (o resto você descobre lá, no livro).

Ainda que esta seja só uma história infantil, desperta reflexões necessárias. Em primeiro lugar, o rei não é o único ser desligado deste planeta. Muitos de nós só repara no sol quando ele não aparece (nem por isso saímos por aí procurando quem o roubou!).

Em segundo lugar, o sol é só uma metáfora, representa tudo o que temos à disposição todos os dias e sequer notamos, talvez porque estejamos ocupados demais sendo, tentando ser ou divulgando que somos felizes. Cuidado! Afinal, felicidade cega.

Carla Kühlewein É graduada em Letras Vernáculas e Clássicas (UEL), Mestre em Teoria Literária e Literatura Comparada (Unesp) e Doutora em Literatura e Vida Social (Unesp).

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Carla Kühlewein

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